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sexta-feira, 21 de janeiro de 2022




 

Sabe o que é a meditação e para que serve?

 

Algumas pessoas julgam que meditar é pensar profundamente sobre algum assunto. Também poderá ser, mas o termo em geral é usado para designar uma prática usada, por exemplo, em algumas religiões como o budismo ou certas correntes da psicologia como forma de terapia no seu sentido mais amplo possível. Neste caso meditar não envolve a preocupação de pensar em algo profundamente, mas não pensar de todo, ou seja, esvaziar a mente de pensamentos, criar o vazio tornando a mente imperturbável e serena. Esta é com certeza uma tarefa difícil pois somos constantemente bombardeados por pensamentos de toda a espécie a toda a hora e a todo o momento, grande parte das vezes sem tomarmos consciência disso.

 

Convido o leitor a fazer aqui uma pausa para tentar esvaziar a sua mente por apenas um minuto, ou seja, não pensar em nada.

 

(...)

 

Difícil não é? Pois a nossa mente está num estado de burburinho constante e que não é fácil fazer calar, sendo assaltada por preocupações a todo o momento.

 

Várias são as práticas meditativas que se dedicam a fazer calar este burburinho constante criado pela nossa mente e várias são também as técnicas usadas, mas nem todas envolvem ficar sentado(a) imóvel durante longo tempo de pernas cruzadas e com as mãos sobre o regaço. Por exemplo o tai chi é uma meditação em movimento e a  prática do tiro ao arco no budismo Zen tem também a componente meditativa. Na verdade, podemos meditar enquanto executamos qualquer tarefa e até é desejável que o façamos.

 

“A meditação é simplesmente um estado natural de quietude no qual todas as coisas que normalmente são reprimidas, se veem autorizadas a vir à superfície”.

Renée Weber, Dialogue avec des scientifiques et des sages, La quête de l’unité (traduit de l’américain par Paul Couturiau), Editions du Rocher, Chapitre 3 – De la matière et de maya, pág.108 – tradução para português da versão francesa


 

Mas para quê esvaziar a mente e entrar num estado de vazio?

 

Antes de mais é necessário compreender a verdadeira natureza do nosso “eu”. 

O “eu” é uma construção (transitória) que se começa a formar desde que nascemos, sob influência do meio familiar, não esquecendo também a herança genética e posteriormente sob influência do meio sócio/cultural em que se nasce, incluindo a própria língua que falamos que é outra condicionante na forma como percebemos e encaramos a realidade.

 

Em resumo, o “eu” é construído como peças flexíveis que se interlaçam umas nas outras e vai-se modificando ao longo dos anos, mas sem perder um sentido de unidade e coerência, correspondendo cada uma dessas peças às condicionantes familiares, sócio/culturais e linguísticas como foi anteriormente referido. O que faz este “eu” um ser único é a forma como são dispostas, ou interlaçadas, todas as “peças”. Posto isto poder-se-á dizer que o “eu” é um conjunto de informações condensadas de forma única em cada indivíduo, sendo o causador do ruido constante na nossa mente, a corrente de pensamentos incessante e que temos dificuldade em controlar.

 

É neste ponto preciso que intervém a meditação através de práticas e técnicas várias. Em primeiro lugar procura esvaziar e serenar a mente despojando-a do redemoinho constante de pensamentos e preocupações que também afectam seriamente a nossa saúde, para assim poder entrar em contacto com a instância que permanece para além do “eu” transitório e a que Carl Gustav Jung deu o nome de o “em Si” (self), o mestre que nos guia, o centro da nossa psique e de onde emana todo o potencial energético de que ela dispõe. A Psicologia Transpessoal designa esta instância transpessoal (o que está para além da pessoa ou “eu”) por consciência universal, indo talvez um pouco mais longe do que Jung, entrando assim em concordância com as correntes “religiosas” do Budismo das quais recebeu influência.

 

É este esvaziar e serenar a mente o objectivo primeiro da meditação que se pode revestir de técnicas várias e é neste esvaziamento que o “em Si” se pode manifestar de forma livre e espontânea, sem os habituais constrangimentos inerentes ao “eu” apreendidos através do meio familiar e sócio/cultural.

 

Para atingir esta finalidade são usadas determinadas técnicas meditativas ou formas ritualizadas.

 

Ritual

 

Como já vimos é difícil manter a nossa mente vazia, livre de ideias e das habituais preocupações que circulam livremente sem controlo. Ora o ritual é precisamente uma das formas de manter a mente atenta, concentrada, para assim evitar a divagação com o afluxo constante de pensamentos produzidos pelo “eu” transitório.

 

Parece que os orientais perceberam isto melhor do que nós ocidentais que vemos em determinadas formas ritualizadas algo chato e enfadonho (exemplo disso são os Katas no judo!) mas que os orientais, nomeadamente os japoneses, aplicam em algumas actividades do dia a dia sob influência do Budismo Zen. Exemplo disso é a cerimónia do chá, os arranjos florais, o Zen no tiro ao arco, cujo objectivo é a superação do “eu” transitório para que o “em Si” se manifeste de forma livre e espontânea, amplificando assim o nível da  consciência e procurando atingir o plano de consciência Universal, da Unidade, do Todo. O “em Si”, como tal é permanente e inviolável, a verdadeira raiz do ser humano, ao contrário do “eu” transitório, uma construção que muito provavelmente se dilui após a morte (ou ficará apenas algures como um registo informático). É a máscara que usamos diariamente para representarmos o nosso papel no mundo.

 

Em suma, o ritual ajuda o praticante a manter-se conectado com o “em Si”. Um pequeno deslize no ritual significa que por momentos a mente divagou, desconectou-se e deixou-se levar para fora do “em Si”. Por outro lado, o ritual que é executado mecanicamente perde todo o significado mesmo se os gestos e os actos são feitos no seguimento mais estrito das regras. Assim a palavra chave é o vazio, a mente serena e desperta mas não activa (torrente de pensamentos). E quando atingido este estado mental a acção surge de forma espontânea e totalmente eficaz. É dentro desta perspectiva que se deve entender a cerimónia do chá, os arranjos florais, o Zen no tiro ao Arco, mas também os Katas no judo, tão mal compreendidos pelos praticantes ocidentais.

 

No entanto o ritual, como tantas outras coisas, pode desvirtuar-se convertendo-se num emaranhado de gestos protocolares, uma “teia de aranha” que em vez de proporcionar a libertação aprisiona o indivíduo à sua teia, perdendo assim o seu propósito.

 

No estado da mente vazia e serena a consciência amplifica-se, todos os constrangimentos e barreiras socio/culturais que se impõem ao ”eu” desfazem-se, tornando a mente livre e ilimitada adquirindo assim a sensação da totalidade e conduzindo o indivíduo à experiência do ilimitado, do Universal, do Uno.

 

É por esta razão que os mestres Zen recusam um ensinamento formal através da linguagem, falada ou escrita, pois esta é uma forma fragmentada de transmissão de conhecimento. Sendo uma representação da realidade não a mostra tal e qual, ou seja, é conceptual e limitada, pois ao atribuir um nome a todas as coisas perde a noção do conjunto, do Todo e sendo um veículo ou um intermediário entre o que conhece (sujeito) e aquilo que é conhecido, interpõe-se como um terceiro elemento interpretando a realidade. Por exemplo, um mesmo texto pode ter interpretações diferentes, ainda que ligeiras.  

 

Daí a frase atribuída a Chuan Tse, um taoista que viveu pouco depois de Confúcio: “Quem sabe, não fala, quem fala, não sabe. E por isso os homens sábios praticam o ensino sem falar.”

 

É óbvio que segundo este princípio só posso concluir que eu nada sei!

 

 

 

Para quem esteja interessado em aprofundar os temas aqui abordados, eis alguns livros:

C.G. Jung, O eu e o Inconsciente, edição Vozes (edição brasileira);

Eugen Herrigel, O Zen na arte do Tito ao Arco;

Stanislav Grof, A Psicologia do Futuro, Via Óptima (sobre psicologia Transpessoal) 

Alan Watts, O budismo Zen

 

Texto original de Pimenta


sexta-feira, 24 de dezembro de 2021


 

A insustentável impertinência do Narcisista

 

O Narcisista é uma espécie de deus vivo sobre a Terra onde apenas o próprio conta sendo os outros meros figurantes, penumbras, num jogo em que ele é o “Rei” a peça principal.

 

O Narcisista é um solitário que vive em si e para si e assim sendo torna-se numa espécie de solipsista (1). A sua experiência com a realidade que o rodeia é idêntica à de uma criança entre os três e cinco anos para a qual o centro do Universo está em si. Por isso tal como a criança que quando quer uma coisa exige “eu quero!” e por mais que lhe seja explicado isso não ser possível, a criança manterá firme a sua vontade acrescentando apenas um “mas” eu quero! recusando-se aceitar um não como resposta, também o Narcisista recusa o não como resposta.

 

Este é o retrato do Narcisista em sentido abstrato, mas ele existe na realidade em vários “tamanhos”, nas várias classes sociais e até como entidade colectiva: um grupo, tribo ou Nação. É como uma doença que contaminou o ser humano, podendo afectar em maior ou menor grau, transmitindo-se de geração em geração sem fim à vista e pior ainda, sem o devido reconhecimento, o que não é de admirar pois o Narcisista nunca se reconhece enquanto tal.

 

Em resumo, sendo o Narcisismo uma espécie de “doença”, qualquer indivíduo está sujeito a ser “contaminado”, seja um pobre ou um rico, o explorado ou o explorador, pois o narcisista pobre deseja igualmente ser rico não olhando a meios para atingir o seu objectivo e o narcisista explorado uma vez na posição inversa de explorador não se fará rogado. E a História tem-nos mostrado tantas vezes este retrato ao longo dos tempos.

 

O Narcisista pode ser o merceeiro manhoso que adultera as contas do cliente relativamente aos preços afixados para assim obter um lucro ilícito, ou o politiqueiro igualmente manhoso que em vez de servir a Nação  dela se serve em benefício próprio colhendo vantagens tanto económicas como sociais e assim poder subir na hierarquia, ou o artista cujo ego aumenta na mesma proporção em que é aplaudido e diminui na mesma proporção em que as palmas se “esbatem”, ou o filósofo erudito que escreve textos e tratados que só o próprio entende, ou apenas uma pequeníssima minoria e mesmo assim consegue obter reconhecimento público. E a lista seria tão extensa que daria quase um tratado!

 

O Narcisismo passa do indivíduo ao grupo familiar e deste à tribo até chegar às Nações. E assim surgem as conquistas, as guerras, as matanças, que se justificam com as mais estupidificantes teorias “filosóficas”(2), pois o conquistador Narcisista, tal como a criança, afirma “eu quero” e tudo fará para obter o que deseja não se inibindo de produzir sofrimento no outro, por vezes numa matança elevada à glorificação em que o outro que se lhe opõe, a personificação do mal, tem de ser combatido e deposto, existindo apenas como mero figurante num espectáculo em que o Narcisista Nação é a  figura principal de um jogo de poder viciado desde o início. Assim as Nações justificam os seus feitos.

 

A glorificação narcisista das conquistas, exalta os seus heróis, muitas vezes com pés de barro e simultaneamente cria uma espécie de amnésia colectiva relativamente às barbaridades cometidas e outros feitos menos dignificantes. Mas quem poderá atirar a primeira pedra?! E esta glorificação narcisista encontra-se plasmada em Mitos, Cânticos, poemas onde o “carniceiro” matador é transformado em herói, louvado e amado. Do outro lado, o inimigo, a personificação do mal destituído de toda a humanidade, o mero figurante, a penumbra. E a História tem-nos mostrando tantas vezes este quadro!

 

A Nação Portuguesa não é excepção, ora glorificando-se narcisisticamente com os seus feitos e conquistas, ora anulando-se e subjugando-se a outras potências, carpindo as suas mágoas pela perda do Império, como a criança que perde o seu brinquedo favorito, num lamento voltado para dentro de si numa atitude igualmente narcisista mas de sinal negativo, como se toda a fatalidade estivesse contida em si e gerando um pessimismo Nacional tão característico dos portugueses (a frequência com que os portugueses dizem mal de si mesmos é desconcertante!). Em suma, ora a glorificação, ora a lamentação de todo o mal que recaiu sobre a Nação, as duas faces da mesma “moeda”: a insustentável impertinência do Narcisismo.

 

(1)  Solipsismo doutrina filosófica que afirma que todo a realidade é um produto, ou uma construção do sujeito e como tal nada existe fora dele.

 

(2) Exemplo disso foram as teorias surgidas nos séculos XIX e XX que visavam fundamentar as conquistas e o domínio sobre outros povos pelos Impérios emergentes.

 

Texto original de Pimenta


domingo, 28 de novembro de 2021


 

 

Yin-Yang: Conhece o verdadeiro significado deste símbolo?

 


Este símbolo taoista do yin-yang de origem chinês popularizou-se muito no Ocidente, mas será que a interpretação que dele fazem os ocidentais é a que corresponde aos princípios do taoismo da qual este símbolo é o reflexo? Será que os ocidentais com a sua tendência para interpretarem todo o saber que lhes é estranho reduzindo-o e transformando-o para se adequarem à sua visão, lhe confere o significado genuíno?



Comecemos pelo princípio. Como foi referido anteriormente este é o símbolo da Filosofia Taoista, cujo representante mais conhecido no ocidente é Lao Tzeu que terá escrito o famoso “Tao Te King”, havendo no entanto um outro autor, Chuang Tze  que sendo menos conhecido no ocidente, viveu posteriormente a Lao Tzeu e escreveu uma série de textos essencialmente aforísticos, “pérolas preciosas” que todos os ocidentais que presam o saber deveriam ler sem os habituais filtros da sua cultura, incluindo aqueles que negam a existência de uma filosofia oriental por faltar aos seus mais ilustres sábios a exposição de todo um corpo de saber, uma doutrina, de forma sistematizada, exprimindo-se essencialmente por aforismos.

 

Mas voltando ao símbolo em questão. Numa avaliação mais apressada poderíamos dizer que estamos em presença de um símbolo representativo de um sistema dual ou binário. Ora essa interpretação espelha a maneira como os ocidentais vêem o mundo, ou seja, a dualidade é a forma como observamos a realidade que nos rodeia e essa característica vem muito antes de Descartes ao qual é atribuída a separação “dos dois mundos”, a dicotomia entre res extensa e res cogito, corpo e alma, matéria e espírito. No entanto esta característica já se encontra nos filósofos pré-socráticos como Parménides por exemplo. Ao proclamar que o ser é e o não ser não é, afirma um ponto de vista dualístico. Em Heraclito esta dualidade está implícita por exemplo na seguinte afirmação: “Os contrários concordam e a bela harmonia nasce do que difere. Tudo nasce da luta”. Também os princípios da lógica formatam a nossa mente para uma visão dualística: uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo; uma coisa ou é ou não é.  

 

 

Em suma, a nossa forma de pensar é intrinsecamente dualística e isso reflecte-se também nas várias áreas do saber e da actividade humana, como exemplo no sistema computacional binário (0 e 1). Mas a nossa vida social também é composta por uma visão dualística, algumas vezes extremadas: ou se é a favor de alguma coisa ou se é contra, não há meio termo e por isso mesmo tendemos a ver a realidade a preto e branco. São inúmeros os exemplos mas darei apenas um. Antigamente um professor que batia num aluno fazendo uso frequente da régua e da humilhação era normal e encarado como tal. Não havia qualquer legislação que protegesse as crianças em idade escolar dos maus tratos que por vezes eram infligidos por “pessoas obscuras” com o título de professores. Actualmente o caso mudou de figura e ainda bem, no entanto caiu-se no outro extremo. Há casos em que são os alunos que agredirem os professores ou outros colegas. Foi notícia aqui há alguns anos atrás de um caso desses. Um aluno agrediu um professor. O castigo do aluno foi a mudança de escola! Talvez para agredir outra pessoa na nova escola e assim sucessivamente ir mudando de escola até chegar ao fim da escolaridade obrigatória.

 

 

Resumindo, a visão dualística impede-nos de ver a unidade e é disso mesmo que se trata neste símbolo do yin-yang. Ver nele uma dualidade é como dizer que uma moeda é composta de duas realidades, cara e coroa e não de uma só, a moeda em si. Não existe dualidade neste símbolo, nem tensão entre opostos como em Heraclito, mas uma unidade que se harmoniza com as suas duas polaridades que se interconectam e nascem uma da outra como se pode observar quer nos pequenos círculos de cor oposta quer pela continuidade do conteúdo da circunferência que muda para a cor oposta quando atinge o seu pico (enchimento máximo).

 

 

Não existe no pensamento chinês tradicional uma visão dualística da realidade como para nós ocidentais, não existe a distinção entre energia e matéria pois consideram que a matéria é a própria energia condensada. E só será possível entender o pensamento oriental se percebermos isto e soubermos assimilar esta forma de ver a realidade. Mas notemos que Einstein na sua célebre equação E=mc2 está em concordância com o pensamento oriental, ao afirmar que a E=energia é igual à m=massa (matéria) vezes c2=a velocidade da luz ao quadrado. Fazendo equivaler a matéria à energia os dois conceitos passam a ser um só! 

 

 

Como foi referido no artigo anterior “Será o Universo uma Sinfonia Musical 3ª parte” o físico dinamarquês laureado com prémio Nobel, Niels Bhor, adoptou este símbolo chinês taoista do yin-yang no seu brasão, pois ele observou que os estados polarizados das partículas se complementam, tal como a simbologia do yin-yang cujos extremos se complementam equilibradamente reflectindo assim a visão taoista do Universo. Viu neste símbolo a solução para as contradições, paradoxos, com que os físicos se deparavam na física quântica, contradições essas fruto de uma visão dualística. Exemplo disso é a famosa experiência de O Gato de Schrödinger: “... é uma experiência mental, frequentemente descrita como um paradoxo, desenvolvida pelo físico austríaco Erwin Schrödinger, em 1935. A experiência procura ilustrar a interpretação de Copenhague da mecânica quântica, imaginando-a aplicada a objetos do dia-a-dia. No exemplo, há um gato encerrado em uma caixa, de forma a não estar apenas vivo ou apenas morto, mas, sim, vivo e morto.” in Wikipédia. (Para quem se interessar e quiser aprofundar o assunto poderá ver o link:

https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-e-o-gato-de-schrodinger/).

 

 

Ora o paradoxo também existe na ciência devido à visão dualística como os cientistas perscrutam a realidade! Niels Bhor muito provavelmente percebeu isso ao ter conhecimento da doutrina taoista e da simbologia do yin-yang na qual ele viu a solução para as (aparentes) contradições da física mecânica.

 

 

Em resumo o pensamento ocidental perdeu a noção do conjunto, da unidade do Todo e isso também se reflecte na forma como vemos os outros. Alguém que socialmente tenha um comportamento exemplar dificilmente é reconhecido como uma pessoa que também pode ter um lado muito obscuro, monstruoso até. Ou seja, na visão dualística as duas realidades não existem em simultâneo na mesma pessoa e no entanto exemplos desses abundam por aí!

 

Texto original de Pimenta

 


sábado, 6 de novembro de 2021


  

A História de Tibo e a Lagoa dos Antigos

   (caso não tenha lido o artigo anterior "Tibo e a Lagoa dos Antigos" clic no link em baixo)

https://blogdapimenta11.blogspot.com/search/label/Informa%C3%A7%C3%A3o)


 

Tibo e seus arredores são uma povoação muito mais antiga do que se possa pensar e por isso mesmo as pessoas locais chamam à Lagoa que fica perto da aldeia “Lagoa dos Antigos”.

 

Mas quem eram esses Antigos? 

Não deixou nada escrito este povo que habitou há muito tempo estas paragens, muito antes dos romanos e dos iberos que por aqui passaram. Tudo o que se conhece sobre este povo sem nome e sem designação nos chega através de uma tradição oral e simbólica que foi passando pelos vários povos que por aqui viveram posteriormente, havendo também uma breve referência de alguns historiadores antigos, nomeadamente Estrabão, o filósofo e geógrafo grego. Mais tarde esta tradição oral e respectivos símbolos foram compilados num livro do séc. XVI atribuído a um humanista e hermetista de origem Florentina, Giovanni Maro, que andou por estas paragens e que muito se interessou por este povo singular, sem nome. No início do século passado um habitante desta aldeia editou um livro de autor, que se encontra esgotado, fazendo um apanhado de toda a tradição oral socorrendo-se também do livro de Giovanni Maro.

 

 


Crê-se que este povo sem designação terá habitado esta região muitos milhares de anos antes de Cristo. Reza a tradição que chegaram vindos do mar, depois de terem enfrentado uma catástrofe que se abateu sobre a Terra, em que as águas do mar engoliram várias regiões do planeta incluindo aquela onde habitavam, tendo a maioria da população perecido. Estes eram os sobreviventes dessa catástrofe que faz parte da memória colectiva de vários povos.

  

A razão pela qual terão escolhida uma região tão distante da costa parece prender-se com o facto de se sentirem mais seguros longe do mar dadas as circunstâncias pelas quais passaram.

 

Esta gente que aqui aportou trazia consigo uma civilização cultural e socialmente muito avançada e muito rica, mas mais importante ainda era o domínio que tinham sobre as suas mentes. 

 

 

Era um povo pacifista que abominava a guerra e desprezava a luta pelo poder, por isso mesmo não havia no seu seio disputas pela liderança, pois todas as decisões eram tomadas pela comunidade dirigida ou melhor dizendo aconselhada por um grupo de anciãos, homens e mulheres sábios e que eram reconhecidos como tal, destacando-se entre eles um casal muito respeitado e ouvido pela comunidade de nome Tíbio e Perónia, nomes estes que lhes podem ter sido atribuídos posteriormente pela imaginação popular e não serem os nomes verdadeiros. Foram estes que com os seus sábios conselhos dirigiram este povo para esta localidade que é hoje conhecida por Tibo, uma corruptela do nome de Tíbio, onde encontraram um paraíso à sua medida, pleno de magia e de encanto e que serviu os seus propósitos. Primeiro encontrar um lugar específico onde as forças da natureza, que eles sabiam dominar na perfeição, se faziam sentir nesta região e em particular na zona da denominada Lagoa dos Antigos, para assim poderem entrar em contacto directo com as “forças da Natureza” que lhe permitiam encontrar a harmonia divina e assim restabelecer a ligação entra o Céu e a Terra, ligação essa que se terá perdido durante o período caótico pela qual a humanidade terá passado após a catástrofe que se abateu sobre a Terra. Por isso a Magia era do conhecimento comum deste povo que aprendia a Arte da Magna Magia desde muito pequenos, dominando o vento a chuva o fogo e a terra (as suas forças telúricas).

 

Maioritariamente comunicavam sem palavras, sendo estas utilizadas sobretudo como forma invocativa nos actos da Magia em que a vibração da palavra detinha um poder sobrenatural podendo dar origem à criação de novos seres ou a forças benéficas para a comunidade e ainda fazer levitar enormes menires que eram colocados em lugares específicos orientados para determinadas constelações com o efeito de produzir uma espécie de circuito magnético poderoso e simultaneamente fazer a ligação com o Céu habitado pelos “deuses”, beneficiando assim da protecção destes.

 

Embora a linguagem falada fosse ocasionalmente escolhida como modo de exprimirem os seus pensamentos, sendo esta já uma forma de decadência da sua cultura que se haveria de acentuar com o passar dos anos assim como outras características que se foram perdendo, como a harmonia do grupo, a ausência de querelas, o espírito de comunidade onde todos cuidavam de todos, a transmissão do pensamento era o modo natural e desejável de comunicação e por isso mesmo a mentira, a maledicência, eram desconhecidas deste povo, uma vez que não havia como esconder qualquer tipo de pensamento.

 

Era na Lagoa dos Antigos e no prado verdejante que se encontra ainda hoje perto da dita Lagoa, onde faziam as suas cerimónias e os seus actos de Magia que os levava para “regiões” e dimensões que ultrapassam em muito a imaginação do mais fértil sonhador. Estes actos de Magia eram presididos pelos anciãos mais conceituados e reconhecidos como tal por toda a comunidade onde sobressaía o casal Tíbio e Perónia. Eram eles que na verdade dirigiam, sem comandar, este povo, pois a noção de comando, autoridade, estava ausente do seu pensamento. Havia dirigentes, sim, mas que não se impondo pela força ou pela persuasão das palavras, se “impunham” (à falta de outra palavra melhor!) pela persuasão dos seus seres, a sua sapiência, a sua visão, o seu bom senso, a sua generosidade, enfim, o seu carácter, características estas que a nós, hoje, nos podem parecer tão estranhas e que com toda a certeza estão ausentes da classe que actualmente nos governa.

 

Diz-se que as suas moradas translúcidas e cristalinas eram feitas de uma substância muito subtil, etérea. A quintessência? Ou será que era aquilo que hoje conhecemos como plasma, o quarto estado da matéria e que eles já dominavam?

 


Os cépticos dizem que esta civilização nunca existiu e que tudo não passa de lendas e mitos construídos ao longo dos tempos pela fértil imaginação popular argumentando com o facto de nunca ter sido descoberta qualquer evidência arqueológica que suportasse a tradição oral. No entanto, se pensarmos que também Tróia foi  considerada durante muito tempo apenas um Mito relatado na Ilíade de Homero e posteriormente se veio a descobrir que afinal a dita cidade de facto existiu, pode levantar-se a questão: Será a História de Tibo e a Lagoa do Antigos um Mito que se poderá tornar realidade?"

 

História ficcionada por Pimenta